encontrarte 2025

No passado dia 26 de julho de 2025, a Caixa Negra apresentou dois concertos na Casa da Botica, encerrando a sua participação curatorial na 9.ª edição do Encontrarte Amares com um gesto sonoro que atravessou o corpo, o espaço e a noite.

A oportunidade de intervenção artística nesta casa oitocentista em ruína — edifício identitário no coração de Amares — ofereceu não apenas um lugar para escutar, mas um território a reativar. A fonte da Casa da Botica, elemento simbólico e arquitetónico do conjunto, acolheu dois momentos performativos: Luís Contrário ocupou o interior da fonte; Mix’Elle instalou-se sobre a sua estrutura superior. O gesto não foi apenas performativo — foi arqueológico, quase ritual: dar corpo ao som como quem devolve respiração à pedra.

A primeira atuação esteve a cargo de Luís Contrário, multi-instrumentista a viver entre o “post-punk outonal” e a eletrónica mais dançante. O seu concerto partiu do disco Músicas de Dança Para Pessoas Tristes — editado em 2023 — e materializou-se como uma viagem entre pulsação e recuo, entre ritmo e reverberação íntima. Num ambiente de luz baixa e texturas densas, cada loop insinuava um refúgio, e cada batida dançada parecia conter a memória de algo que se perdeu (ou se encontrou). Não se tratava de afugentar a tristeza, mas de a coreografar.

Mix’Elle assumiu depois o espaço com um set que atravessou diferentes paisagens sonoras, oscilando entre a intensidade do drum & bass e do jungle, mas também atmosferas expansivas de dub e texturas mais experimentais próximas do IDM. A artista apresentou temas de Spiritual Rhythms, o seu primeiro trabalho enquanto produtora, lançado este ano, após mais de duas décadas a afirmar-se como DJ.

Dois momentos distintos: o som insurge-se contra a supremacia da imagem — não descreve, nem ilustra, mas propõe uma escuta que devolve vida ao que o olhar não vê.